Longe de entregar o que gostaríamos de ver e, claro, ouvir, musical tem pontos positivos
Por Brígida Rodrigues
Se tem uma coisa que tem se tornado um problema cada vez mais frequente na internet é o efeito manada. Aliás, não só na internet. Em tudo, aparentemente. As pessoas estão sedentas para dar informação. E se informar também. O papel do crítico acaba ficando num entre lugar – e um que eles não necessariamente gostam, e opiniões como a de sites não especializados (como este que vocês carinhosamente leem) são cada mais valorizadas.
Em prol disso, prometi a mim mesma que não leria absolutamente nada sobre o proshot de Diana: O Musical, até que os créditos subissem e eu pudesse colocar os meus pensamentos em ordem. Aliás, um padrão que tentarei sempre seguir nos reviews e artigos de opinião que vierem – e, esperamos, sejam muitos.
Dito isso, vamos ao que interessa – aqui vale um aviso: contém spoilers do musical. E a primeira pergunta que me veem a mente quando anunciam mais um filme/documentário/série/livro sobre a Família Real ou, especificamente, Lady Di, é: será mesmo necessário? E entendam, não vou ser hipócrita e dizer que não vibro com isso. Não me orgulho, vejam bem, mas assisto muito The Crown e afins. Odeio a monarquia, mas me divirto com os seus problemas domésticos que variam de e se eu reformar o jardim e colocar uma quadra de tênis a se interferirmos nisso podemos causar uma crise institucional que de alguma forma afetará milhares de pessoas. Sério, como ainda existem reis e rainhas?
De toda forma, se divertir com a Família Real é uma coisa. Fazer mais produções de uma tragédia é outra. E aqui a minha crítica não vai para o musical em si, que fique claro. É só uma questão geral e que não se limita nem apenas a vida da Diana, mas toda uma noção de pegar determinados fatos históricos e trazê-los de maneira irresponsável para o palco ou para as telas. Essa era a minha maior preocupação em relação à versão musical, e pude descansar quanto a isso. Não há necessariamente um espetáculo em torno de sua morte, mas em torno da sua vida.
Querendo ou não, Diana foi uma mulher pública e fez coisas incríveis com os privilégios e o alcance que possuía. Ela tinha plena noção disso. Não se desculpava ou se vangloriava, mas fazia o melhor que podia com o que estava ao seu alcance.
Diana foi uma mulher subestimada. Como tantas outras, ela foi escolhida para ser moldada. Peguem um rostinho bonito, coloquem um vestido bacana e sorria. O modelo perfeito de esposa, certo? Mas esqueceram que ela era mais que isso. Embora toda a sua vida tenha sido sustentada numa aura de fantasia e leveza, Diana era também humana. Imprevisível. Todas as vezes que tentaram prever qual seria o seu próximo passo, Lady Di tomava uma direção oposta e surpreendia.
Havia, claro, deliberação em muitos de seus atos. Diana era jovem e ingênua quando se casou, mas da pior maneira teve que descobrir como deslizar pelos caminhos tortuosos e escorregadios da monarquia britânica. E em cada look, em cada vestido glamoroso, havia também um recado. Sutil, mas estava lá. Da maneira que pode ela se expressou. Até que não precisou mais ser sutil e, quase literalmente, brilhou. Amada por todos, exceto, talvez, o próprio Charles.
E todo esse roteiro vocês já sabem, certo? Não vou contar se, secretamente, assistiram The Crown. Aqui entre nós, Olivia Colman vale a pena. E embora não tenhamos Colman nos palcos – infelizmente – temos outras coisas positivas para destacar.
A primeiríssima coisa positiva sobre o proshot de Diana: é um proshot. Fato. Inegável. Precisamos de mais proshots! Sempre e mais, por favor, mandem mais proshots. Posso citar a palavra por mais dez vezes no texto, não me importo. Proshot. Proshot. Proshot. E mais: um lançado antes dos palcos. É exclusividade que vocês querem? Temos! Aliás, parece até piada que até 2019 haviam pessoas argumentando exaustivamente no fórum que gravações não dariam certo por que etc, etc, etc. Então, por favor: pessoas de NY, assistam presencialmente também, ok? Façam isso ser um sucesso. O fã de teatro musical que não mora em São Paulo, Londres ou Nova York implora.
Segunda coisa positiva: figurinos. Não consigo pensar em nada ruim. Não consigo lembrar de nenhum vestido mal feito. Nada. Todos impecáveis. Menção honrosa, inclusive, ao vestido branco da famigerada dança. Sério, Charles, o que há de errado com você, garoto? Também temos o vestido de casamento – sim! Belíssimo! E, claro, como não poderia faltar: o pretinho nada básico da vingança. O famoso Revenge Dress. Além disso, há algumas trocas bastante impressionantes, e me fizeram pensar se não era a edição me enganando. Parece que não.
E sobre figurinos deslumbrantes, podemos falar também da cenografia. Muito linda! Há muito luxo, mas de uma maneira elegante. É diferente da suntuosidade deliberada de alguns musicais. Você tem plena consciência de que custou com certeza uns bons milhões de dólares, mas valeu a pena. A iluminação também é outro ponto a parte: não é só um complemento, é parte essencial do musical. E, sim, eu sei, tudo é parte essencial no palco, luz principalmente, mas aqui ela é quase um personagem, crucial em determinadas cenas. E o efeito desejado foi certamente atingido. Nunca imaginei que um jogo de flashs me faria chorar, mas aqui estou eu.
E falando em chorar, vamos à última música – que estava presente no trailer e já havia me conquistado então. Temos If (Light the World) em que Jeanna de Waal canta lindamente Meu futuro é minha decisão/Minha história é finalmente minha/E vou iluminar o mundo para, logo em seguida, termos a cena da sua morte. Inclusive, vale ressaltar, como meu amigo Nich observou, há alguma semelhança com o final de Hamilton, em que Eliza canta o que ela faria após a morte do seu marido.
Então, o que exatamente não funcionou em Diana: O Musical? Há momentos bizarros que poderiam facilmente ser engraçados se tivessem sido intencionais. Como não são, você apenas fica: o que vocês estavam pensando? É um momento bastante estranho quando Lady Di e o Príncipe de Gales estão num concerto e ela divaga pensando em todas as maneiras em que ela não gostaria de estar ali. A ideia é até legal, e gostei do efeito narrativo, mas a letra é terrível. “Posso não ser puro intelecto, mas talvez haja uma discoteca”? E infelizmente esta foi uma das cenas liberadas antes do musical estrear na Netflix, então posso entender porque as pessoas ficaram receosas.
E se fosse o Queen tocando/Freddie Mercury arrasaria
Bem, não tenho dúvidas. Mas, sério?
Também não gosto das cenas dos paparazzis dançando como abutres e fazendo uma coreografia estranha com os sobretudos. Pareceu tão caricato e… ruim?
E embora eu entenda que a proposta do musical seja passar brevemente pela vida da Diana e que, por motivos óbvios, não podemos dispor do tempo que uma série teria para fazer isso, imagino que o diretor pudesse ter sentado com o seu libretista e combinado: ei, vamos tentar não passar tudo isso de forma atropelada e desistir das cenas do namorado sem camisa? Sei que foi um romance decisivo porque o Charles o usou de forma deliberada para virar o divórcio a favor dele e, principalmente, de Camila Parker Bowles, mas tudo acontece tão rápido e fora do tom que o musical fica genérico. As piadas são ruins e você não sabe se o musical quer ser sério ou uma paródia.
É possível contar fatos históricos e brincar com o humor. Vemos isso o tempo todo. Letras provocativas e bem-humoradas são o ápice de muitos musicais. Mas cenas que não tinham nenhuma pretensão de sátira só ficaram estranhas e forçadas. Antes tivessem sido feitas propositalmente, mas como não foram você fica confuso porque sabe que não pode rir: eles estão falando sério.
Mas se vale alguma coisa, as cenas onde aparecem Barbara Cartland, escritora favorita de Diana, são realmente divertidas. Quando ela aparecia, só conseguia pensar: poxa, isso poderia ter sido bom. Havia algum potencial ali, porque o elenco é forte, mas as letras de algumas das canções estragaram tudo. E isso, combinado com uma direção duvidosa, foram a fórmula para o fracasso. Sei que amanhã, quando começar a ler críticas de outros jornais, encontrarei manchetes terríveis – e, sinceramente, não posso culpá-los.
Mesmo assim, de forma geral, não consegui odiar o musical. Acho que vê-lo pessoalmente seria uma experiência interessante. Como proshot ele pode soar decepcionante (mas não vamos falar isso muito alto, ok?). E talvez porque a Princesa de Gales seja tão etérea, tão inteligente e gentil, engraçada, que seja difícil fazer jus, mas então teríamos que desconsiderar o papel brilhante de Emma Corrin – e, pelo visto, de Kristen Stewart em Spencer. Mas o problema não foi a atuação ou elementos técnicos da obra, e sim mais algo na construção da narrativa – o que é uma pena. E se o libreto de um musical é ruim, o que resta? Se a maior parte das músicas não dão a devida profundidade emocional que o personagem merece, como vai se sustentar nos palcos? Aí está o erro.
Costumava medir o quão bom é uma coisa pela máxima: vou querer assistir de novo? Então é bom. Mas considerando que assisti Fantasma da Ópera por mais de cem vezes e, tenho certeza, o teatro musical não é unânime nos elogios, excluí essa regra. Então quantas vezes vão querer assistir eu não sei, mas sei que vale (pelo menos) a primeira.
Você pode assistir na Netflix a partir de agora e, com sorte, na Broadway em novembro.
Primeiramente, Proshot não faço ideia do seja, mas me parece algo muito desejado! Então, queremos mais Proshot, por favor. Acredito fortemente na ideia de que alguém da BM deveria assistir esse musical em primeira mão! Há várias coisas a se considerar ainda, seria uma atuação mediana ou na elaboração de um roteiro que tentou passar no humor, mas falhou? Ainda mantenho uma enorme curiosidade sobre esse musical, bem como na ideia de que algum lado da história dela possa ser contato de uma forma leve e bem humorada, como Lady Di sempre parecer ser.