Uma experiência única, encantadora e surpreendente, um novo olhar do incrível cometa.
Essa frase resume a noite que tive no último domingo no ‘Espaço União Fraterna’ em São Paulo. Por dois dias a escola de teatro musical ‘A Voz Em Cena’ transformou o espaço e levou o público para a antiga Rússia.
Normalmente, a BM não faz review de montagens acadêmicas ou independentes, ajudamos com a divulgação da forma que podemos mas acabamos não criando uma crítica sobre a produção, pois sabemos que o que está sendo apresentado exigiu muito esforço de todos (muitas vezes dinheiro do próprio bolso dos envolvidos) e não nos cabe julgar, porém ao sair do musical ‘Natasha, Pierre e o Grande Cometa de 1812’ senti que precisava falar sobre essa produção e deixar comentários sobre ela.
O que vou falar aqui foi com base na apresentação do elenco ‘Inês Brasil’ (nome que me tirou uma boa risada). Se não fossem alguns detalhes, eu não me lembraria em momento algum que a produção que assisti era um produto acadêmico, com um elenco vibrante e uma produção brilhante ‘A Voz em Cena’ fez um ótimo trabalho. Pegar um musical de Dave Malloy e colocar de forma tão única no palco foi um desafio realizado com maestria por esses artistas brasileiros.
Para quem não conhece a história, O Grande Cometa é uma adaptação inspirada de Malloy de um recorte de 70 páginas de Guerra e Paz contando a história de jovens amantes impetuosos de Tolstói, enquanto incendeiam Moscou em uma aventura épica de romance e paixão.
A direção de Thiago Dombidau nessa produção trouxe uma visão nova do musical para aqueles que assistiram a versão profissional em 2018 apresentada pela Del Claro Produções. As escolhas cênicas feitas por Dombidau fizeram com que cada momento do musical fosse único. Além de dirigir 21 jovens que ficavam espalhados pelo palco imersivo, algumas cenas contaram uma nova forma de serem apresentadas, um trabalho genial. As versões das músicas por Stela Sokolnik vieram com atualizações para as letras e um ar de novidade em cada canção, por mais de uma vez me peguei cantando as já conhecidas versões de 2018 e fui surpreendido por um novo momento.
Partindo para o elenco, peço que gravem esse nome Ana Kraut, a doce Natasha da história, Kraut trouxe para o papel que já foi de Phillipa Soo na off-broadway e Denée Benton na Broadway, algo novo, uma versão que fazia um mix de doçura com uma personalidade forte e destemida, aqui Natasha tem medos e sofre por suas decisões mas ao mesmo tempo sabe que é dona de si.
Felipe Andra como Anatole foi sensacional, seus vocais e interpretação do jovem malandro, gato e fanfarrão fizeram com que todos ali saíssem apaixonados, querendo fugir com Anatole pelo inverno da Rússia. O ator foi mais um do elenco que fez seu personagem ter sua própria versão. Leonardo Cipriano, o Pierre da versão, prendeu o público no seu último momento do musical, seu diálogo com a Natasha prendeu cada segundo da atenção de todos, era impossível tirar o olhar do ator.
Marianna Swann, a Marya Madrinha de Natasha, foi quem me fez ter medo das ações (irresponsáveis) de Natasha, a atriz além de uma voz poderosa trazia na sua interpretação uma seriedade e poder de expressão que me fazia tremer a metros de distância. Stela Sokolnik, a Mary sem sal, não tinha falta de sal nenhuma, a atriz apesar de nova (assim como todo o elenco) tinha uma carga emocional em sua interpretação que trazia para o público sua real angústia, tristeza e anseios que eram passados de uma forma sutil mas ainda assim brilhante.
E agora eu chego em Hélene, como alguém pega um papel eternizado por Amber Gray na Broadway e Carol Bezerra no Brasil e ainda assim arranca 1 minuto de aplausos calorosos do público? Bruna Trajano é o nome dela. A atriz que participou do programa ‘Talentos’ da TV Cultura, foi um destaque maravilhoso na produção, sua versão de Charming foi simplesmente um deleite encantador para todos ali, fiquei encantado como Trajano conduziu a performance trazendo um toque seu para a personagem hipnotizando a cada segundo da sua presença no palco.
E para encerrar, tive uma grata surpresa, Lucas Cuevas, o ator conseguiu um feitio que para mim era impossível, pegou um personagem chato e até esquecível em alguns momentos e tornou ele um centro de atenções. Cuevas teve o difícil trabalho de fazer o velho Bolkonsky, seu poder nesse papel foi maravilhoso, não era difícil ver cabeças virando para ver o ator mesmo quando ele não estava no diálogo, seu dueto com Stela (Mary) foi surpreendente, forte e cômico.
Assim como muitas pessoas que foram assistir essa produção, eu poderia passar horas falando desse musical e de como essa montagem foi algo mágico. Deixo meus parabéns para todo ensemble que tinha o trabalho dificílimo de ajudar a contar a história e ainda assim interagir com o público, o carisma de todos em cena e fora dela cativou cada lugar.
É claro que houveram falhas em alguns momentos, como em toda produção, algumas escolhas acabaram deixando o público pensando ‘será que era para ser isso mesmo?’, inclusive recorri a pessoas que tinham ido em outras sessões para confirmar alguns pontos. De qualquer forma, posso dizer que, na minha opinião, se algumas produções gigantes fizessem um terço do que esse cometa conseguiu fazer os espetáculos estariam em níveis absurdos de qualidades.
Por fim, a você que está lendo isso, dê uma chance às produções e montagens acadêmicas, apoie esses artistas em formação e desenvolvimento e terá a oportunidade de ver performances brilhantes.
Felipe! Estive lá na estréia, família em peso, prestigiando Rebecca, (ensemble), minha sobrinha. Foi simplesmente uma gratíssima surpresa o todo do espetáculo! Tão vibrante, bonito de ver, ouvir e estar pertinho de jovens talentos. Parabéns ao Diretor e todos que contribuíram para esse sonho de realizar. Espero que esse grupo nos brinde com novas surpresas. E que bonito e expressivo texto vc escreveu!