O programa Reviver Cultural é uma iniciativa da Prefeitura do Rio em parceria com a Companhia Carioca de Parcerias e Investimentos. O projeto conecta imóveis ociosos com estabelecimentos artístico-culturais, apoia financeiramente a reforma de espaços icônicos e incentiva projetos que têm o objetivo de revitalizar o Centro da cidade por meio da arte e cultura.
Uma dessas iniciativas é a Livraria Autografia, casa das Feras Tropicais, primeira companhia teatral com sede em uma livraria no Rio de Janeiro. Em cartaz com o espetáculo autoral Sala de Jantar das Gaiolas, com texto de Cadumma e Luana Zanotta, a história transforma uma espécie de circo-prisão em uma metáfora da sociedade brasileira.

Sala de Jantar das Gaiolas mistura cabaré, mitologia popular, música e humor irreverente. A peça é uma grande fábula feroz sobre opressão, vingança e sobrevivência, onde o fogo surge como força mítica capaz de destruir e recriar.
São cinco personagens, sob o domínio de Tofu, vivido por Guilherme Miranda que externa no olhar e nos movimentos toda a brutalidade dessa figura, que dá medo e ojeriza. É o grande maestro ditador, violento, machista e autoritário, que dá as cartas naquele lugar.
Luana Zanotta vive Guapa, e encarna com firmeza o turbilhão de sentimentos e questões, que envolvem Tofu, que parece fazer questão de ser especialmente cruel com ela, e Arú, personagem que entra depois e provoca uma reviravolta em toda a prisão.
Psitta começa como uma incógnita. Com o desenrolar da história, se torna um misto contraditório de inocência e crueldade. Manu Calmon consegue trazer todas as camadas e nuances da personagem apenas com o olhar, navegando entre a frieza e a ternura.
Já Mikon, personagem de TON, joga de acordo com o que é conveniente naquele lugar, e encontrou sua forma de sobreviver em meio a barbárie. TON apresenta as fragilidades e sutilezas do personagem, o que acaba gerando a compreensão, e até a empatia do espectador.
A última prisioneira a cair nesse circo-prisão é Arú, vivida por Tami Coelho, que chega inconformada e destemida, mas logo é atropelada pela realidade do lugar. Sua entrega e intensidade tornam o espetáculo ainda mais pulsante. Logo se descobre que Guapa e Arú têm um passado, que influi diretamente na vida de todos os personagens. A parceria entre Luana e Tami exala sensualidade e química. Conseguimos sentir que ali tem amor, mágoas e muitas questões mal resolvidas.
A companhia foi muito corajosa em trazer um espetáculo tão rico e tão vivo para o espaço de uma livraria. Tudo ali foi muito bem pensado para trazer a plateia para dentro da história: as luzes, o palco, os movimentos, a música, com uma banda ao vivo que adiciona muito à ambientação, o uso do espaço, onde até a rua é utilizada como parte da cena. Enquanto aquela história é contada, o público esquece completamente que está em uma livraria, pois não são apenas os objetos que mudam, mas também a atmosfera. Tudo isso sendo executado com pouquíssimos recursos e um orçamento enxuto, é realmente louvável.
Sala de Jantar das Gaiolas é a prova de que arte se faz fazendo, quase sempre com poucos recursos e muito suor. A companhia Feras Tropicais não pulsa somente a cultura no Centro do Rio, com um texto criativo, corajoso, e um elenco entregue, também pulsa o sangue correndo em nossas veias e nos dá a sensação de que estamos vivos, coisa que a arte faz como ninguém.
O espetáculo está em cartaz na Livraria Autografia, rua do Rosário, 78, Centro, nos dias 18, 19, 25, 26 de novembro, 02 e 03 de dezembro, terças e quartas, às 20h.


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